Este boletim é produzido bimestralmente pela Felizardo e Ruzon Advogados Associados, com distribuição aos seus clientes e parceiros. Não deve ser considerado opinião legal para qualquer operação ou negócio específico. É autorizada a sua reprodução desde que identificada a autoria.
SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA NA COMPRA DE VEÍCULO Por Bruno Ponich Ruzon

É muito comum no mercado brasileiro a aquisição de veículo automotor mediante contrato de financiamento bancário, havendo inclusive um negócio jurídico único, com conexão contratual conforme disposto no artigo 54-F, do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90).
Ocorre que além dos juros remuneratórios, que já seriam suficientes para custear a operação e garantir a rentabilidade das instituições financeiras, elas criaram vários outros “valores”, muitas vezes nomeados de “taxas” ou “tarifas”. Esta nomeação é absolutamente errônea e não se sustenta juridicamente, servindo apenas para confundir os consumidores que, na maioria das vezes, entendem pela obrigatoriedade de seu pagamento. Mas não são taxas e nem muito tarifas. Não há qualquer dever ou obrigação legal de concordar com sua incidência ou mesmo em realizar o seu pagamento.
Dentre elas está o “seguro de proteção financeira”. Ele é um tipo de “seguro prestamista” que tem como objetivo principal atenuar os riscos da operação, atrelados a situações como morte, invalidez ou desemprego do segurado, no caso o consumidor, em benefício da instituição financeira. Quando ocorre o sinistro, o valor da indenização não é destinado ao segurado, mas sim ao banco.
Embora, seja possível vislumbrar indiretamente um benefício ao consumidor, pela extinção da dívida respectiva, como em nosso sistema a responsabilidade por dívidas é patrimonial, o maior beneficiado acaba sendo o banco mesmo, pela diminuição do risco de inadimplência em tais situações.
Geralmente os fornecedores impõe a referida “taxa” como se fosse algo obrigatório, condicionante da conclusão do negócio.
Ocorre que esta prática é absolutamente ilegal, porque limita a liberdade do consumidor e configura a chamada venda casada (art. 39, I, da Lei 8.078/90).
O Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre situação parecida nos financiamentos imobiliários e reconheceu a ilegalidade desta prática conforme o Tema 54/STJ e a Súmula 473/STJ.
Quanto aos contratos de financiamento de veículo, sua ilegalidade foi reconhecida no Tema Repetitivo 972/STJ, ficando consignado que “Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada”. Logo, diante deste cenário normativo, o consumidor não é obrigado a contratar o “seguro proteção financeira” muito menos com a parceira da instituição financeira, podendo questionar esta imposição mediante reclamação no Procon ou mesmo judicialmente.
RESPONSABILIDADE PELA DÍVIDA CONDOMINIAL: STJ REAFIRMA A NATUREZA PROPTER REM E A LEGITIMIDADE PASSIVA CONCORRENTE Por Christopher Romero Felizardo

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o REsp 1.910.280, caso relacionado ao Tema 886 dos recursos repetitivos, reafirmou a natureza propter rem da obrigação condominial e reconheceu a legitimidade passiva concorrente entre o promitente vendedor e o promissário comprador, mesmo na hipótese de imissão de posse sem registro do contrato em cartório.
No caso concreto, um condomínio ajuizou ação de cobrança contra um casal por débitos condominiais referentes ao período entre 1987 e 1996. O imóvel ainda era formalmente de propriedade de uma companhia habitacional, embora já estivesse na posse do casal desde 1985, por meio de uma promessa de compra e venda. Após a sentença favorável ao condomínio, foi requerida a penhora do imóvel, o que motivou a companhia proprietária a apresentar embargos de terceiros, alegando ilegitimidade para responder pela dívida.
A relatora, ministra Isabel Gallotti, destacou que embora o Tema 886 preveja que o conhecimento da posse pelo condomínio possa afastar a legitimidade do promitente vendedor, essa interpretação não pode ser automática. A ministra chamou atenção para a necessidade de leitura cautelosa das teses repetitivas, especialmente quando se considera a teoria da dualidade do vínculo obrigacional, conforme já defendido em precedentes como o REsp 1.442.840.
A decisão enfatiza que a promessa de compra e venda não vincula o condomínio, o qual é titular de uma obrigação propter rem, que se liga diretamente ao imóvel, independentemente da vontade ou dos acordos entre particulares. Assim, mesmo que o comprador esteja na posse e o condomínio tenha ciência da transação, o proprietário registral continua responsável pela dívida perante o condomínio, podendo ter o imóvel constrito para satisfação do débito.
Em síntese, o STJ manteve a orientação de que a obrigação condominial é vinculada ao direito real sobre o bem. Dessa forma, enquanto não houver transferência formal da propriedade, o titular registral responde pelas obrigações geradas pelo imóvel, inclusive de forma solidária com o possuidor.
DESCONTOS INDEVIDOS NO INSS: COMO IDENTIFICAR E QUAIS SÃO OS SEUS DIREITOS Por Matheus Capobianco Maciel

Cada vez mais aposentados e pensionistas do INSS vêm sendo surpreendidos com descontos mensais em seus benefícios sem que tenham autorizado qualquer operação. Na maioria dos casos, trata-se de cobranças relacionadas a cartões de crédito consignado, cédulas de crédito bancário ou operações realizadas por meio eletrônico sem consentimento válido do beneficiário.
Esse tipo de desconto indevido é extremamente grave, pois compromete diretamente a verba alimentar da pessoa idosa ou hipossuficiente, que muitas vezes tem na aposentadoria sua única fonte de renda. Em geral, essas operações envolvem supostas contratações realizadas digitalmente, com “reconhecimento facial” e “assinatura eletrônica”, o que gera ainda mais insegurança para quem não possui familiaridade com tecnologia.
É importante saber que, mesmo que valores tenham sido depositados na conta do segurado, isso não configura automaticamente um contrato válido, especialmente quando não há solicitação, uso do valor ou recebimento de cartão. Se não houve autorização clara e expressa, a instituição financeira não pode realizar descontos, e o consumidor não é obrigado a assumir uma dívida que não contratou.
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, essas práticas violam a boa-fé, o dever de transparência e configuram falha na prestação do serviço. Além disso, o artigo 42 do CDC prevê a devolução em dobro de valores pagos indevidamente, acrescidos de juros e correção. O dano moral, por sua vez, é presumido (in re ipsa) nesses casos, já que o desconto indevido causa angústia, transtornos e compromete o sustento do consumidor.
Se você ou alguém que conhece está enfrentando essa situação, o primeiro passo é consultar o extrato de empréstimos consignados no site ou aplicativo “Meu INSS” e reunir comprovantes dos descontos. Em seguida, busque orientação jurídica. Um advogado especializado poderá analisar o caso, ingressar com a ação cabível e buscar a reparação integral dos danos, inclusive com pedido de tutela de urgência para cessar os descontos de imediato.
* OBS.: Imagens geradas pelo ChatGPT 4.0